Bhagavad-gita: O Caminho Para A Autorrealização
- Vana Madhuryam Brasil
- 11 de dez. de 2024
- 25 min de leitura
Atualizado: 12 de dez. de 2024

Srila Bhaktivedanta Vana Gosvami Maharaja
18 de julho de 2024, Jaraguá do Sul, Brasil
Já são mais de nove horas, e ainda teremos uma linda apresentação de dança. Por isso, quero falar poucas palavras, pois o tempo é muito curto. Neste mundo material, temos muito tempo para gastar de diversas maneiras, mas quando falamos sobre temas espirituais, o tempo fica muito curto. De qualquer maneira, temos que ouvir hari-katha (assuntos sobre Deus), pois assim, nosso coração se purificará.
Vocês estão aqui neste lindo local, o qual foi organizado para que seja falado a Bhagavatagitamrtam. A Acyuta Priya traduziu muito bem as aulas de Srila Gurudeva, Srila Bhaktivedanta Narayana Gosvami Maharaja, especialmente quando ele veio ao Brasil em 2010, no seu último vyasa-puja. A família da Acyuta é a família priya, pois nela estão a Govinda Priya, a Acyuta Priya, a Damodara Priya, e sua irmã Krishna Priya. Por essa razão, a família dela foi apelidada por mim de “família priya”, que significa “aquela que é muito próxima de Srimati Radhika”.
Esse ambiente é muito auspicioso e benéfico para que sejam faladas as palavras da Bhagavad-gita, a Bhagavatagitamrtam. Neste mundo material, as pessoas comuns fazem diversas atividades materialistas. No entanto, ao escutar as palavras da Bhagavad-gita, você fica protegido da ilusão desse mundo, maya.
O que significa gita? Gi-ta. “Gi” — grhate giyate trayate iti gita. Grhate significa que, se você glorificar o Senhor, ficará protegido da ilusão, maya. Neste kathavasa, o próprio Senhor Supremo deu instruções para Arjuna. Por isso, na Gita é dito: “sri krishna uvaca”, ou seja, o próprio Senhor instruiu Arjuna diretamente.
O próprio Senhor se manifestou na forma de shabda-brahman, a vibração transcendental. Esse shabda-brahman é muito poderoso. Existem dois tipos de som, shabda: o som material e o som transcendental. Neste mundo, o que falamos uns aos outros é o som material, shabda-samana, e essa vibração atinge apenas o nosso corpo e a nossa mente.
Darei um exemplo: se eu te glorificar, você ficará feliz, mas se eu usar palavras duras, você ficará chateado. Isso é verdade, não é? Contudo, esta vibração material apenas diz respeito ao nosso corpo e a nossa mente. Esse som material atinge o corpo grosseiro, que é físico, e o corpo sutil, que é mental.
A Srimad Bhagavad-gita traz essa filosofia. Ela diz que esse corpo é feito de cinco elementos. Existe o corpo grosseiro, e dentro do corpo grosseiro existe o corpo sutil, que é a mente, a inteligência, o ego e o coração. Isso significa que o som material só cria o efeito da vibração em nosso corpo material grosseiro e sutil.
Quando um cantor muito bom vem à sua cidade, talvez você entenda ou não o que ele canta, mas quando o ritmo sai de sua boca, todos se levantam e começam a dançar e cantar, não é verdade? Talvez você entenda o que ele canta, talvez não; mas a vibração gera um efeito em seu corpo e sua mente. E assim, milhares de pessoas ficam juntas, cantando e dançando.
Por outro lado, existe um outro som chamado shabda-brahman, a vibração transcendental. Essa vibração transcendental cria um efeito em seu corpo físico, na sua mente e também na sua alma, atma. Ou seja, enquanto o som material, shabda-samana, não toca sua alma, o som espiritual, shabda-brahman, toca o seu corpo, a sua mente e a sua alma.
Portanto, o significado da Gita é: grhate giyate traiyate iti gita — se você glorificar o Senhor, ficará protegido de maya.
Neste mundo material, maya é muito poderosa. Maya significa a potência ilusória do Senhor. Ilusão é aquilo que não é verdade, mas você passa a pensar que é. Às vezes, quando estamos dirigindo, ao meio dia, no sol escaldante, olhamos em direção à estrada, e pelo reflexo da luz solar, parece que existem ondas de água do mar no asfalto. No entanto, isso é apenas uma ilusão. Da mesma maneira, maya, a potência ilusória do Senhor, cria a ilusão e faz o que não é verdade parecer real.
Por esse motivo, Krishna disse: “Arjuna, ouça com atenção”.
daivī hy eṣā guṇa-mayī
mama māyā duratyayā
mām eva ye prapadyante
māyām etāṁ taranti te
(Bhagavad-gītā, 7.14)
[Esta Minha energia divina, que consiste dos três modos da natureza material, é difícil de ser suplantada. Mas aqueles que se renderam a Mim podem facilmente transpô-la.]
Vocês conhecem este sloka? Vocês precisam aprendê-lo, senão como irão conquistar maya? Desse modo, maya irá te pegar.
Daivī hy eṣā guṇa-mayī… Krishna diz: “Ó Arjuna, Minha daivī maya é muito poderosa e ninguém pode conquistá-la. Somente aquele que completa e absolutamente se rende aos Meus pés de lótus poderá conquistar maya.” Daivī hy eṣā guṇa-mayī, mama māyā duratyayā... Todos devem aprender esse verso, pois ele é muitíssimo importante na nossa vida espiritual.
Voltando ao significado da palavra gi-ta, “ta” significa trayate — protegido de maya. Mas como se proteger de maya? Rendendo-se completa e absolutamente aos pés de lótus do Senhor. Isso é muito importante.
Se você recitar todos os dias os versos da Bhagavad-gita, ficará protegido de maya. Isso ocorre porque a Bhagavad-gita é uma manifestação direta da boca de lótus do Senhor chamada shabda-brahman, vibração transcendental. Eu disse para vocês que existem dois tipos de som, o som material e o som transcendental. Bhagavan, o Senhor Supremo, falou todas essas conclusões filosóficas, tattva, para Arjuna na Bhagavad-gita. Nos dezoito capítulos da Bhagavad-gita, ele nomeou os dezoito nomes do yoga. Contudo, três yogas são proeminentes: karma-yoga, bhakti-yoga e jnana-yoga.
Karma-yoga é descrito nos capítulos do primeiro ao sexto. Bhakti-yoga é abordado nos capítulos do sétimo ao décimo segundo, que correspondem aos capítulos centrais. Já jnana-yoga é explicado do décimo terceiro ao décimo oitavo capítulo.
Bhakti está descrita nos capítulos centrais porque karma e jnana não são ramificações de bhakti. Karma e jnana não podem dar, de forma independente, nenhum tipo de fruto a não ser que estejam sobre o abrigo de bhakti.
kevala jñāna ‘mukti’ dite nāre bhakti vine
kṛṣṇonmukhe sei mukti haya vinā jñāne
(Śrī Caitanya-caritāmṛta, Madhya-līlā, 22.21)
[O conhecimento especulativo por si só, sem o serviço devocional, não é capaz de conceder a liberação. Por outro lado, mesmo sem conhecimento, uma pessoa pode alcançar a liberação se estiver engajada no serviço devocional ao Senhor.]
Agora iremos falar sobre bhakti. O que significa bhakti? Bhajate savate iti bhakti. A palavra em sânscrito bhajate significa servir, ou humor de serviço. Quando você serve uma pessoa, ela automaticamente te abençoa. Essa é a natureza. No Mahabharata, observamos que dois grupos estavam presentes no campo de batalha de Kurukshetra: os filhos de Pandu, chamados de Pandavas; e os filhos de Dhritarashtra, chamados de Kauravas. Por qual razão esses dois grupos opostos chegaram ao campo de batalha de Kurukshetra? Para estabelecer a Verdade Absoluta, o dharma, a religiosidade — estabelecer o que é perfeito e necessita ser estabelecido.
Por este motivo, Krishna disse a Arjuna: “Seu objetivo principal não é jaya e nem parajaya”. Jaya significa “vitória”, e parajaya significa “derrota”. Quando uma partida de futebol como a Copa do Mundo está acontecendo, por exemplo, você não sabe quem obterá a vitória. A seleção brasileira é a mais poderosa, e o Brasil pode jogar contra a Argentina ou contra a Alemanha; mas a vitória, jaya, ou a derrota, parajaya, não está em suas mãos.
Portanto, Krishna disse a Arjuna: “A derrota e a vitória não estão em suas mãos — karmany evadhikaras ma phaleshu kadacana. Arjuna, você tem o direito de praticar sua ação e seus deveres (karma), mas Eu quem dou o resultado ou o fruto”. Lembrem-se sempre disso:
karmaṇy evādhikāras te
mā phaleṣu kadācana
mā karma-phala-hetur bhūr
mā te saṅgo ’stv akarmaṇi
(Bhagavad-gītā, 2.47)
[Você tem o direito de executar seu dever prescrito, mas não tem o direito aos frutos da ação. Jamais se considere a causa dos resultados de suas atividades, e jamais se apegue ao não-cumprimento do seu dever.]
Krishna disse para Arjuna: “Lābhālābhau jayājayau… — conseguir ou não a vitória não está em suas mãos.”
sukha-duḥkhe same kṛtvā
lābhālābhau jayājayau
tato yuddhāya yujyasva
naivaṁ pāpam avāpsyasi
(Bhagavad-gītā, 2.38)
[Lute pelo simples fato de lutar, sem levar em consideração felicidade ou aflição, perda ou ganho, vitória ou derrota — e, adotando este procedimento, você nunca incorrerá em pecado.]
Um agricultor cultiva o campo e planta trigo, arroz e diversas outras plantas, deixando o campo completamente verde. No Brasil há muitos campos de arroz, assim como a Bengala, onde nasci. Como um agricultor, você pode plantar cana-de-açúcar, soja, feijão, trigo, arroz ou milho, mas o quanto você colherá não está em suas mãos. Às vezes, o campo de arroz está maduro — tudo está perfeito e pronto para a colheita — mas, um dia antes, uma tempestade pode destruir tudo. Dessa maneira, você conseguirá colher o resultado da plantação? Quem já cultivou campos sabe dessa experiência. Muitas pessoas que vivem na cidade talvez não tenham ideia disso, mas quem mora no campo e cultiva a terra, conhece bem essa realidade.
Por este motivo, Krishna disse: “Ó Arjuna, escute com muita atenção. Por que você veio ao campo de batalha de Kurukshetra? Não foi para se vingar dos Kauravas, como Dhuryodhana e Dushasana. Você veio estabelecer o dharma perfeito”. Não é nada fácil conquistar os Kauravas, como Duryodhana, Dushasana, Karna, Bhisma Pitamaha e Dronacharya — eles são muito poderosos.
Especialmente, Bhisma Pitamaha ganhou uma benção chamada icchamrtiyu, na qual ele poderia escolher o momento da própria morte, de acordo com o seu desejo. Dessa forma, ninguém poderia matá-lo. Como seria possível conquistá-lo? O guru Dronacharya estava lá. Como é possível conquistar seu próprio guru?
Karna é uma pessoa muito poderosa. Ele possui uma kavaca, um escudo para proteger seu peito, e um kundala, um brinco especial. Enquanto ele possuísse essas duas coisas, ninguém poderia matá-lo.
Ashvathama, o filho de Dronacharya, recebeu a benção de ficar vivo nas quatro yugas (eras) — Satya, Treta, Dvapara e Kali-yuga. Dessa forma, ninguém pode matá-lo. Portanto, quem pode derrotar os Kauravas?
Arjuna disse para Krishna: “Senayor ubhayor madhye — quero ver os dois exércitos. Por favor, coloque minha quadriga no meio do campo de batalha. Assim, posso ver os dois lados”.
Assim como no início de uma partida de futebol: sempre há uma apresentação que mostra quem são os onze jogadores brasileiros e os onze jogadores argentinos, para que todos possam identificar quem estará em campo.
Arjuna disse: “Eu quero ver quem eles são”. Desse modo, Arjuna viu todos os seus parentes, e nesse momento, ficou decepcionado: “Todos os meus parentes irão morrer!”.
Arjuna tinha um ego: “Eu tenho esse arco Gandiva. Com arco e flechas, posso matar qualquer um. Como posso matar meu avô Bhisma Pitamaha? Na minha infância, eu deitava em seu colo, e ele me alimentava com arroz e leite. Como é possível eu matar meu guru Dronacharya, o qual me deu todas as lições sobre arqueria? Como é possível eu matar todo o meu guru-varga (sucessão discipular) que está do lado oposto? E se eu atacar todos eles, e eles de fato morrerem? Qual será meu benefício? É verdade que conseguirei essa terra, mas ela estará completamente manchada com o sangue deles. Muitas mulheres se tornarão viúvas, muita gente morrerá e todos irão chorar; haverá cremação por todos os lados”.
Desse modo, Arjuna ficou vishada, infeliz. Contudo, Krishna o inspirou: “Ei, Arjuna. Você está pensando que irá matar Bhisma Pitamaha, Dronacharya, Karna e Ashavathama, mas tente entender que não é tão fácil conquistá-los”.
O primeiro capítulo da Bhagavad-gita chama-se vishada-yoga. Este capítulo dá um panorama muito belo sobre a visão de tudo que está acontecendo. Krishna disse: “Arjuna, ouça com cuidado. Karmany evadhikaras ma phaleshu kadacana, você tem o direito de executar a ação ou o karma. Labhalabhau jayajayau, no entanto, a vitória ou a derrota não está em suas mãos”. Assim como no exemplo da seleção brasileira, que é muito poderosa, mas se ela será vitoriosa na Copa do Mundo ou não, não depende de nós.
Você deve cumprir o seu dever, isso é um fato. Por isso, Krishna disse: “Acorde Arjuna, uthistata! Pare com essa lamentação. Não pense que você veio até aqui para se vingar! De fato, os Kauravas atearam fogo na casa dos Pandavas, deram veneno para Bhima e tentaram tirar a roupa de Draupadi na frente de todos, mas não pense que se vingará ao conquistá-los. Vocês vieram até aqui para estabelecer a Verdade Absoluta, o dharma.”
“Dhuryodana e Dhushasana são a personificação do pecado, papa-murti, e agora, esse pecado personificado está completamente cercado por uma parede grande e muito poderosa. Se você quiser conquistar Dhuryodhana e Dhushasana, primeiro deve quebrar essa parede poderosa — Bhisma Pitamaha, Dronacharya, Karna e Ashvathama. Eles não são pessoas comuns. Se você não conquistá-los e não matá-los primeiro, como conquistará Dhuryodana e Dhushasana?”, disse Krishna.
Então, Arjuna compreendeu que aquilo era verdade: “Eu não posso conquistar todo o meu guru-varga. Isso não é possível. O que fazer e o que não fazer? Eu não sei mais…”. Krishna disse: “Simplesmente renda-se a Mim”. Eis uma instrução poderosa da Bhagavad-gita:
sarva-dharmān parityajya
mām ekaṁ śaraṇaṁ vraja
ahaṁ tvāṁ sarva-pāpebhyo
mokṣayiṣyāmi mā śucaḥ
(Bhagavad-gītā, 18.66)
[Abandone todas as variedades de religião e simplesmente renda-se a Mim. Eu o libertarei de todas as reações pecaminosas. Não tema.]
Krishna diz: “Abandone todos os seus deveres e renda-se completamente a Mim”. Você pode pensar: “Se eu abandonar todos os meus deveres com a sociedade, posso ir para o inferno”, mas Krishna disse: “Eu sou Bhagavan, a Suprema Personalidade de Deus. Renda-se a Mim e eu te libertarei de todos os resultados das suas atividades pecaminosas. Mas neste meio tempo, Eu preciso dizer que muitas pessoas não sabem qual é o significado de dharma, a verdade, e adharma, a inverdade”.
O que significa a verdade? Satyam bada, sempre fale a verdade. Jamais fale mentiras, adharma. Satyam bada satyameva jayate — todas as glórias à verdade. Satyam é a Verdade Absoluta. Contudo, o que seria essa Verdade Absoluta? O que significa dharma e adharma?
tatraiva śrī-bhagavad-vākyaṁ
maṇ-ṇiṃittaṃ kṛtaṃ pāpaṁ
api dharmāya kalpate
mām anādṛtya dharmo 'pi
pāpaṃ syān mat-prabhāvataḥ
(Hari-bhakti-vilāsa, 110, de Śrīla Sanātana Gosvāmīpāda; Padma-Purāṇa)
[No Padma Purāṇa, a Suprema Personalidade de Deus disse: “Se alguém peca por Minha causa, seus pecados se tornam atos piedosos. Se alguém se recusa a Me adorar, então, pelo Meu poder, seus atos piedosos se tornam pecados”.]
No Mahabharata, Krishna diz que aquele que se rende completa e absolutamente a Ele, mesmo que cometa alguma pequena atividade pecaminosa, está agindo de acordo com o dharma. Por outro lado, alguém que, apesar de realizar muitas atividades piedosas, não se rende a Krishna, está realizando adharma.
Proteger a vida de alguém é bom ou é ruim? Vou exemplificar de uma maneira geral: o açougueiro mata os animais e as vacas — isso é bom ou ruim? Imagine que uma vaca fugiu, e o açougueiro está correndo logo atrás dela. Você é uma pessoa muito piedosa, é vegana e está vendo a vaca correr. A 500 metros de distância, está vindo o açougueiro. Como uma pessoa muito piedosa, você não conta mentiras. O açougueiro lhe pergunta: “Você viu minha vaca passar por aqui?”. O que você responderia? Se a vaca fosse para o lado direito, você falaria que ela foi para o lado oposto, o lado esquerdo. Salvar uma vida está de acordo com o dharma. No entanto, você teria acabado de mentir, e contar mentiras é praticar adharma. E agora?
Quando você conta uma mentira para proteger uma vida, isso está de acordo com o dharma. Krishna diz: “Maṇ-ṇiṃittaṃ kṛtaṃ pāpaṁ api dharmāya kalpate — Se você praticar uma atividade pecaminosa para Mim, isso é dharma”. A definição de dharma é:
dharma-mūlaṁ hi bhagavān
sarva-vedamayo hariḥ
smṛtaṁ ca tad-vidāṁ rājan
yena cātmā prasīdati
(Śrīmad-Bhāgavatam, 7.11.7)
[O Ser Supremo, a Personalidade de Deus, é a essência de todo o conhecimento védico, a raiz de todos os princípios religiosos e a memória das grandes autoridades. Ó rei Yudhiṣṭhira, este princípio da religião se manifesta como uma evidência. Com base nesse princípio religioso, tudo se satisfaz, inclusive a mente, a alma e até mesmo o corpo.]
Krishna é a fonte original de todo tipo de dharma. Krishna diz: “A pessoa que não se rende a Mim, mas faz muitas atividades piedosas, está realizando adharma.” No campo de batalha de Kurukshetra, Krishna disse que Yudhisthira Maharaja nunca mente. Krishna instruiu Yudhisthira: “Diga que Ashvatthama morreu no campo de batalha”. No entanto, Yudhisthira respondeu: “Krishna, mas estou vendo que Ashvatthama, o filho de Dronacharya, está vivo. Como direi que ele abandonou seu corpo no campo de batalha?”. Krishna respondeu: “Estou dizendo para você dizer isso!”. Mas Yudhisthira Maharaja não o fez.
Então, Krishna instruiu Bhima. Havia um elefante vindo em sua direção, e Krishna falou para Bhima: “Mate aquele elefante, cujo nome é Ashvatthama”. Bhima obedeceu e matou o elefante. Então, Krishna disse: “Yudhisthira, agora você pode dizer que Ashvattama foi morto no campo de batalha”. Assim sendo, Yudhisthira Maharaja anunciou: “Ashvattama hatha hath nara va kunjaraha”. No entanto, quando Yudhisthira pronunciou a palavra “nara” informando que o elefante Ashvattama estava morto, Krishna soprou Sua concha e não foi possível ouvir a palavra “elefante”. Ao ouvir isso, Dronacharya, que era o pai de Ashvattama, disse: “Como é possível que meu filho esteja morto? Mas se Yudhisthira Maharaja disse isso, essa é a Verdade Absoluta…”. Naquele momento, Dronacharya largou suas armas, e o irmão de Draupadi, Drishtadyumna, cortou sua cabeça. O Mahabharata estabelece isso — tudo que o Senhor Supremo diz é a Verdade Absoluta.
Por isso, na Bhagavad-gita, Krishna diz: “Quem foi morto? A atma (alma) é eterna e transcendental”. Esse é o primeiro tipo de conhecimento da Bhagavad-gita. Você pode fazer uma pesquisa em toda a Bhagavad-gita e observar que existem somente cinco tipos de conhecimento nela — a Gita contém 745 slokas (versos), mas somente cinco tipos de conhecimento estão presentes.
O primeiro é o conhecimento geral, sadharana-jnana; o segundo é o conhecimento especializado, vishesha-jnana; o terceiro é o conhecimento sobre o brahman, brahma-jnana; e o quarto é o conhecimento sobre a alma, atma-jnana.
sarva-guhyatamaṁ bhūyaḥ
śṛṇu me paramaṁ vacaḥ
iṣṭo ’si me dṛḍham iti
tato vakṣyāmi te hitam
(Bhagavad-gītā, 18.64)
[Porque você é Meu amigo muito querido, estou lhe falando Minha instrução suprema, o mais confidencial de todos os conhecimentos. Ouça enquanto falo isto, pois é para o seu benefício.]
Por fim, o quinto é o conhecimento mais elevado, o qual Krishna explica para Arjuna. Você pode estudar a Bhagavad-gita por completo, não tem problema, mas se aprender 25 versos específicos da Gita, será o suficiente, pois todo o tattva-siddhanta (conclusões filosóficas) está presente neles.
Se você tem muito conhecimento e seu cérebro é aguçado, poderá aprender esses versos sem problemas, assim como meu Gurudeva, Srila Bhaktivedanta Vamana Gosvami Maharaja. Ele era chamado de “dicionário Gaudiya”. Ele tinha um vasto conhecimento de todos os Vedas, Puranas e Upanishads, e sabia todos os versos de qualquer escritura — ele era o dicionário Gaudiya.
Por isso, todos os devotos, os gaudiya-vaishnavas mais elevados, deram a ele esse título de “dicionário Gaudiya”. Se você não encontrasse um verso ou evidência específica das escrituras, era só perguntar para ele, pois ele indicava o local exato do verso na escritura correspondente. No quarto dele haviam muitas escrituras sagradas. As pessoas lhe perguntavam se ele havia lido todos aqueles livros, e ele dizia que sim. Se você abrisse qualquer página e perguntasse o conteúdo que havia nela, ele saberia.
Certa vez, perguntei para ele: “Gurudeva, quantos versos você sabe?”. Ele respondeu: "Se eu falar sem parar por sete dias e sete noites, sem dormir, ainda assim não conseguirei dizer tudo o que sei". Seu poder de memória, smarana-shakti, era maravilhoso. Ele dizia: “Esse sloka veio deste livro, desta edição e foi publicado por essa editora”. Quando perguntamos, por exemplo, de qual capítulo da Bhagavad-gita é determinado verso, pode ser muito difícil lembrar. Mas meu Gurudeva tinha acesso ao conhecimento completo dos Vedas, Puranas e Upanishads. Os versos dançavam na língua dele.
Portanto, se você tiver o cérebro igual ao do meu Gurudeva, aproveite e aprenda. Você abrirá uma página e tudo virá para seu coração. O cérebro de algumas pessoas é muito aguçado. No entanto, se você não consegue aprender todos os slokas, 25 versos da Bhagavad-gita serão o suficiente. Conforme falei anteriormente, existem cinco tipos de conhecimento na Bhagavad-gita, e cada um desses tópicos possui cinco versos essenciais, totalizando 25 versos. Quando aprendê-los, você poderá responder qualquer tipo de pergunta.
Na Bhagavad-gita, é possível encontrar todos os tipos de doutrinas. Qualquer pergunta que surgir em sua mente, você pode saná-la acessando os versos da Gita. Quantos versos vocês têm que aprender? 25 versos, nem mais e nem menos. Isso é o suficiente — 100% garantido.
Atma-jnana, conhecimento sobre a alma; sadharana-jnana, conhecimento geral; vishesha-jnana conhecimento especial; brahma-jnana e guhya-jnana, conhecimento confidencial; guhyatama-jnana, o conhecimento mais confidencial e sarva-guhyatamam bhuyah srnu me paramam vacah, o conhecimento secretíssimo e mais confidencial.
Muita gente diz que Krishna é o maior dos políticos, mas isso não é verdade. Na Srimad Bhagavad-gita, não é papel de Krishna desempenhar política, mas sim estabelecer a Verdade Absoluta Suprema. Por isso, Ele diz:
yada yada hi dharmasya
glanir bhavati bharata
abhyuttanam adharmasya
tadatmanan srjamy aham
(Bhagavad-gītā, 4.7)
[Sempre e onde quer que haja um declínio na prática religiosa, ó descendente de Bharata, e uma ascensão predominante de irreligião — aí então Eu próprio descendo.]
paritrāṇāya sādhūnāṁvināśāya ca duṣkṛtāmdharma-saṁsthāpanārthāyasambhavāmi yuge yuge
(Bhagavad-gītā, 4.8)
[Para libertar os piedosos e aniquilar os descrentes, bem como para restabelecer os princípios da religião, Eu mesmo venho, milênio após milênio.]
Isso é muito importante e não tem nada a ver com diplomacia e política. Ele veio estabelecer a Verdade Absoluta e Suprema, satyan eva. Por que estou dizendo tudo isso? Porque Krishna falou para Arjuna: “Você veio até aqui para estabelecer a Verdade Absoluta”.
Yudhishthira Maharaja se considerava o protetor do dharma, mas Krishna disse: “Eu sou o protetor do dharma”. Yudhishthira Maharaja não seguiu a instrução de Krishna, e por essa razão, ele sofreu um pouco. Se você não seguir a instrução do Senhor, que é a personificação do dharma, você sofrerá.
gītā me hṛdayaṁ pārtha gītā me sāram uttamam
gītā me jñānam aty ugraṁ gītā me jñānam avyayam
(Sri Vaisnaviya-tantra-sara, 44)
[O Senhor Supremo disse: “Ó Partha, a Gita é o Meu coração, a Gita é a Minha essência suprema, e a Gita é o conhecimento mais poderoso e imperecível sobre Mim”.]
yatra gītā-vichāraś cha paṭhanaṁ pāṭhanaṁ tathā
modate tatra śrī-kṛṣṇo bhagavān rādhayā saha
(Sri Vaisnaviya-tantra-sara, 43)
[Com supremo êxtase, o Senhor Supremo Sri Krishna e Sua divina consorte, Sri Radhika, estão graciosamente presentes onde quer que a concepção da escritura da Gita seja discutida, estudada e ensinada.]
Vejam quão poderosa é a Bhagavad-gita. Se você glorificar, ouvir e ler a Gita, o próprio Krishna, com sua potência interna Srimati Radhika, aparecerá diante de você. A Gita não é um livro comum, ela é uma vibração transcendental. Se você ler um pouquinho da Gita todos os dias, alcançará a autorrealização. Especialmente, Krishna estabeleceu bhakti-yoga.
man-manā bhava mad-bhakto
mad-yājī māṁ namaskuru
mām evaiṣyasi yuktvaivam
ātmānaṁ mat-parāyaṇaḥ
(Bhagavad-gītā, 9.34)
[Ocupe sua mente em pensar sempre em Mim, torne-se Meu devoto, ofereça-Me reverências e Me adore. Estando absorto por completo em Mim, com certeza você virá a Mim.]
Esse verso é muito importante. A Srimad Bhagavad-gita é essencial na nossa vida espiritual. A Bhagavad-gita não é uma obra mitológica, mas sim um conhecimento prático que proporciona a autorrealização, transcendendo casta, raça e quaisquer outras designações. Todos podem ler a Bhagavad-gita. Não pensem que a Bhagavad-gita é apenas um livro religioso dos hindus, porque isso não é verdade. O próprio Krishna estabeleceu a Gita — este é um grantha (escritura) poderosíssimo! Portanto, todos devem lê-lo.
[Neste momento, há uma pausa na aula para uma apresentação de dança com a canção “Choti Si Kishori Mere”. Após a dança, a dançarina (Taruni Gopi Didi) e Srila Gurudeva falam o significado da canção. Para conferir, acesse o link da transmissão ao vivo, disponibilizado no rodapé desta aula.]
Não irei tomar mais do tempo de vocês. Agradeço a gentileza por me darem a chance de falar esse hari-katha. Aqui há muitos devotos, e vocês devem ficar inspirados em sua vida espiritual. Todos dias, leiam a Bhagavad-gita e preguem-a para todos. Este é o ensinamento de Sri Chaitanya Mahaprabhu. O Senhor Chaitanya afirmou que, nesta era de Kali-yuga, não há outro caminho para alcançar o Senhor além do cantar os santos nomes.
harer nāma harer nāma
harer nāmaiva kevalam
kalau nāsty eva nāsty eva
nāsty eva gatir anyathā
(Śrī Caitanya-caritāmṛta, Madhya-līlā, 6.242)
[Nesta era de brigas e hipocrisia, o único meio de libertação é o canto dos santos nomes do Senhor. Não há outro caminho. Não há outro caminho. Não há outro caminho.]
Nesta era de Kali, não existe nenhum outro método para se alcançar a morada do Senhor além do cantar dos santos nomes. O Senhor investiu toda a Sua potência nos Seus santos nomes, e o santo nome dEle é mais elevado do que Ele mesmo.
Hari se baḓā hari kā nāma, o santo nome é mais elevado que o próprio Sri Hari, e não existe nenhuma regra para cantá-lo — pode ser ao meio dia, à meia noite, a qualquer momento! Se você cantá-los, seu coração ficará muito contente. Portanto, cante os santos nomes e seja feliz!
“Hare” significa Srimati Radhika, pois, em sânscrito, o nome original dEla é Hara. No entanto, no vocativo, quando você chama Srimati Radhika, o nome Hara se transforma em Hare — e por essa razão, cantamos “Hare”.
Kṛṣṇasya mano haratīti harā rādhā, tasyāḥ saṁbodhanane he hare — “Srimati Radhika, que rouba a mente de Sri Krishna, é chamada de Hara. Ela é invocada como: ‘He Hare!’”. Srimati Radhika rouba o coração de Krishna com Sua belíssima forma e atividades. Krishna, “kṛṣ-dhātu”, a raiz verbal aqui é “atrair”. Ele atrai todas as entidades vivas aos Seus pés de lótus.
Por isso, cantamos:
Hare Krishna Hare Krishna
Krishna Krishna Hare Hare
Hare Rama Hare Rama
Rama Rama Hare Hare
O nome “Rama” vem de “ramayati iti rama”, que significa “Krishna está sempre brincando com Srimati Radhika” — é por isso que Seu nome é Rama. Por essa razão, cantamos: “mero radha ramana giridhari, giridhari syama vana bari”. O nome de Krishna é Ramana Bihari, pois Ele sempre está brincando com Srimati Radhika. Lembre-se sempre lembre destes 16 nomes e 32 sílabas. Nesta Kali-yuga, o único meio de alcançar o Senhor é pelo cantar do maha-mantra.
Quando estes santos nomes se manifestarem em sua língua, todos os seus pecados serão destruídos. Para isso, siga os quatro princípios. Nessa Kali-yuga, não conseguimos fazer sacrifícios e austeridades. Todavia, siga os quatro princípios, são eles: 1) não comer carne, peixe e ovos; 2) não se intoxicar; 2) não fazer sexo fora do casamento; e 4) não jogar jogos de azar.
Também tenham compaixão e amor por todos os seres vivos. Não mate nenhum ser vivo. Não mate nenhum animal. Dê amor e carinho para todos os seres. Não coma carne, peixe, ovos, alho e cebola, e seja compassivo com os animais. Isso é muito importante, pois o Senhor nos deu esse cérebro para diferenciar o certo do errado. Portanto, cante os santos nomes, siga os quatro princípios, dê afeto a todos os seres vivos, e assim, sua vida será bem sucedida.
Tente se tornar vegetariano, mas faça tudo passo a passo, com calma. Se o bambu é muito comprido, por exemplo, em um único dia você não consegue dobrá-lo. Quando o bambu ainda está verde, é fácil dobrá-lo. No entanto, quando esse mesmo bambu está muito seco e velho, ele acaba quebrando com facilidade. Contudo, se você torcer o bambu aos poucos todos os dias, ele acabará dobrando. Similarmente, devagar, passo a passo, tente se tornar vegetariano, mas não adianta forçar. Comece aos poucos. Não é bom assim?
Você precisa dar amor, carinho e compaixão aos outros, senão a sua vida é inútil. Estamos falando sobre isso aqui: pouco a pouco, cantem harinama e façam bhajana e sadhana, porque esse corpo humano é muito raro. Não há garantia de que, no próximo nascimento, você terá um corpo humano, mas se seguir esses quatro princípios e cantar os santos nomes, terá 100% de garantia disso.
Nityananda Prabhu fez uma promessa de mãos erguidas: “Yatheṣṭaṁ re bhrātaḥ! kuru hari-hari-dhvānam aniśaṁ — Ó meus irmãos e irmãs, estou prometendo a vocês e fazendo um voto de que, se cantarem os doces santos nomes ‘Hare Krishna Hare Krishna, Krishna Krishna Hare Hare, Hare Rama Hare Rama, Rama Rama Hare Hare’, na próxima vida alcançarão a morada eterna do Senhor Supremo”. No entanto, preste muita atenção para não cometer as dez ofensas ao santo nome, nama-aparadha.
A primeira nama-aparadha é: nunca critique um sadhu (santo). Se você criticar uma pessoa santa, perderá tudo. Gurudeva disse: “Quem critica um sadhu não é considerado nem um ser humano”. Nunca critique uma pessoa santa, pois isto é satam-ninda.
A segunda nama-aparadha é: nunca pense que o nome de Shiva é igual ao nome de Krishna. Sri Krishna é a Suprema Personalidade de Deus, e Shivaji é seu sevaka (servo). O Senhor Shiva é o melhor dos devotos do Senhor, vaishnavanan yatha sambhuh. Devemos respeitá-lo como o maior dos vaishnavas.
A terceira nama-aparadha é: nunca desonre o guru, guror-avajna. Cante os santos nomes e sua vida será bem sucedida. Tamaso ma jyotir gamaya — não vá para maya. Por favor, não vá em direção a maya, e pare de conversa paralela. Venha para a luz. Quando alguém está falando harikatha e você fica conversando, isso é desonra. Você está desonrando o Senhor que está presente na forma do hari-katha. Essa palestra é O próprio Sri Hari. Por favor, cantem os santos nomes e sejam felizes.
Vejam, este belíssimo Sri Chaitanya Mahaprabhu veio até aqui! [Srila Gurudeva aponta para a deidade de Mahaprabhu.] Mahaprabhu é a personificação da munificência e da magnanimidade, e Ele está dando bênçãos para todos com a Sua mão erguida. Bolo Sacinandana Gaura Hari ki jaya! Jaya jaya Sri Radhe!
Agora, tomem maha-prasada e voltem para suas casas. Amanhã, haverá mais hari-katha.
[Um devoto se aproxima de Srila Gurudeva para agradecer a oportunidade de estar presente naquela aula, e faz as perguntas a seguir.]
Devoto: Os 25 versos da Bhagavad-gita para decorar são específicos ou são versos que tocam meu coração?
Srila Gurudeva: São 25 versos específicos, e todo o tattva-siddhanta (conclusões filosóficas) está presente neles. Mas primeiro, tente ler todos os slokas da Bhagavad-gita. Você precisa aprender especificamente esses 25 versos, mas não é para ignorar os outros e aprender somente estes. Contudo, dentre os 25 versos, você encontrará respostas específicas. Toda a filosofia está presente na Gita.
Darei um exemplo. Há quem fale: “Tudo vem da natureza; mas quem plantou as árvores da floresta? Quem plantou no alto da montanha? Por acaso isso é automático?”. As pessoas dizem isso, não dizem? Existem vários tipos de insetos que surgem da terra. Quando o esterco da vaca está velho, fica cheio de bichinhos. De onde vieram esses bichinhos? As pessoas dizem: “Isso vem da natureza, prakriti. A natureza faz tudo, e isso é prakriti-bhata.” No entanto, a Srimad Bhagavad-gita diz que a prakriti, natureza, não pode fazer nada por conta própria.
mayādhyakṣeṇa prakṛtiḥ
sūyate sa-carācaram
hetunānena kaunteya
jagad viparivartate
(Bhagavad-gītā, 9.10)
[Esta natureza material, que é uma das Minhas energias, funciona sob Minha direção, ó filho de Kuntī, produzindo todos os seres móveis e imóveis. Obedecendo-lhe ao comando, esta manifestação é criada e aniquilada repetidas vezes.]
Krishna disse: “De acordo com a Minha orientação, a natureza cria todas as coisas”. Não quero falar muito, mas as pessoas frequentemente utilizam a palavra “automático”. No entanto, no universo não existe nada automático. Você está deitado na sua cama, por exemplo, e a sua TV está ligada. Seu filho lhe pergunta: “Pai, como essa TV funciona?”. Na sua mão está o controle remoto, mas a criança não viu que era o controle quem fazia a televisão funcionar. Então, você responde a ela: “A TV é automática”, mas ela não é automática.
Falamos “porta automática”, mas ela não é automática coisa nenhuma. Por que a porta abre automaticamente? Porque tem um sensor, um aparelho eletrônico, que é instalado na porta para sentir a presença e abrir. No entanto, se você retirar esse dispositivo eletrônico, a porta deixa de ser automática. A ciência está muito avançada, e por isso, tudo parece ser automático. Contudo, há sempre alguém por trás controlando tudo.
Como uma empresa funciona? Há sempre um diretor, funcionários e equipes, mas o direcionamento vem do CEO da empresa. Ele ordena e todos executam. Krishna falou exatamente isso na Bhagavad-gita: “mayādhyakṣheṇa prakṛitiḥ, sūyate sa-charācharam — Eu Sou o Controlador Supremo. Eu controlo todas as coisas que acontecem, às vezes de forma direta, às vezes de forma indireta”. Leia toda a Bhagavad-gita, pois tudo está lá — tanto a ciência material quanto a ciência espiritual. Por essa razão, leia-a.
Devoto: Estou lendo a Bhagavad-gita há quase um ano. Gostaria de saber, quais são os 25 versos que devemos decorar?
Srila Gurudeva: Fale comigo pelo Skype e eu te direi os 25 versos. Não direi esses versos para qualquer pessoa; direi apenas para quem quer aprendê-los. Senão, as pessoas dirão: “Não lerei o restante da Gita, lerei somente estes versos e já é o suficiente”. Mas não é bem assim. Todas as filosofias e conclusões filosóficas, tattva-siddhanta, estão presentes na Bhagavad-gita.
Você pode cortar a filosofia impersonalista, que é a filosofia das pessoas que dizem: “Eu sou Brahman, eu sou Deus”. Você não é Deus, você pertence a Deus. A Gita afirma que aqueles que dizem que são Deus irão sofrer. A Bíblia também afirma isso. Jesus nunca disse: “Eu sou Deus”. Ele disse: “Eu sou filho de Deus — Ele é meu Pai, e eu sou Seu filho”.
Deus é amor, e amor é Deus. Deus é a Personificação do Amor Divino. A Bíblia e a Bhagavad-gita dizem exatamente a mesma coisa — somente a maneira de dizer é diferente, mas o conteúdo é igual. Se você ler a Gita, a Bíblia e o Srimad Bhagavatam, verá como são iguais. É como diz um ditado popular: “Estes são o mesmo vinho, mas em diferentes garrafas”.
A Bíblia diz “não matarás”, e as escrituras védicas dizem “ahimsa paramo dharma — a não violência é a maior virtude”. A Bíblia diz: “Não matarás. Dê amor e carinho a todos os seres vivos. A compaixão é a maior virtude. Seja compassivo com todos.” E essa é a mesma mensagem que “ahimsa paramo dharma”, dita de maneira diferente. No entanto, as pessoas materialistas interpretam esses ensinamentos visando a própria satisfação.
Srila Gurudeva: Quem você ama?
Devoto: Deus.
Srila Gurudeva: Deus ainda está muito longe. Quem você ama na sua casa?
Devoto: Minha esposa.
Srila Gurudeva: Você tem cachorro?
Devoto: Sim
Srila Gurudeva: Você mataria seu cachorro?
Devoto: Não, porque eu o amo.
Srila Gurudeva: Se você ama alguém, você não a mata, simples assim. Por isso, amor é Deus e Deus é amor. Deus mora no coração de todo ser vivo. O mesmo Deus que mora no seu coração, no coração de sua esposa e dos seus filhos e filhas, também mora no coração do cachorrinho. Desse modo, como você irá matá-lo?
Dê amor para todos. Primeiro, ame a Deus, e depois ame a todos. Isso é simples. Deus é amor e amor é Deus. O Senhor é a Personificação do Amor Divino — prema mayi bhagavan. Isso está descrito nas escrituras védicas, nos Vedas, Puranas e Upanishads.
Esse assunto é muito interessante. A Gita e a Bíblia dizem a mesma coisa. Krishna diz que quem afirma que Ele não possui forma, é um ofensor, aparadhi. Krishna diz: "Como alguém pode dizer que Eu não tenho forma? Eu falo, portanto, como não tenho forma?". Como uma pessoa fala? Ela fala porque tem uma boca, não é mesmo? Você caminha; isso significa que você possui pernas. Apāṇi-pādo javano grahītā (Śvetāśvatara Upaniṣad, 3.19).
Quando é dito que Deus anda, mas não possui pernas, significa que Ele não possui pernas materiais, mas sim transcendentais. A Gita explica tudo isso. Esse tipo de conhecimento chama-se conhecimento geral. Primeiramente, é necessária uma aula de etiqueta, a qual ensina como respeitar a todos, como se sentar, falar e andar apropriadamente, etc. Você precisa aprender tudo isso. Os animais não aprendem a comer e a dormir apropriadamente — no mesmo lugar em que defecam, eles deitam e dormem. Contudo, nós, que somos seres humanos, seguimos determinadas regras de etiqueta. Todos os dias, tomamos três banhos por dia, ou duas vezes, se estiver muito frio. Eu abro uma exceção para vocês. Às vezes, eu mesmo tomo banho duas vezes por dia. Mas quantas vezes os animais tomam banho? Nunca. Ocasionalmente, se você colocá-los na água, eles tomarão banho, mas não será por vontade própria. Somos seres humanos e temos o poder de discriminação — o poder de saber o que é bom e o que é ruim.
tasmāc chāstraṁ pramāṇaṁ te
kāryākārya-vyavasthitau
jñātvā śāstra-vidhānoktaṁ
karma kartum ihārhasi
(Bhagavad-gītā, 16.24)
[É através das normas dadas nas escrituras que se deve, portanto, entender o que é dever e o que não é dever. Conhecendo essas regras e regulações, todos devem agir de modo a elevarem-se gradualmente.]
Na Gita, Krishna diz para Arjuna: “O que você deve ou não fazer, está prescrito nas escrituras”. O primeiro passo é a etiqueta vaishnava. Esse é o primeiro tipo de conhecimento, chamado de conhecimento geral, sadharana-jnana. Depois, você vai acessar o conhecimento especial, vishesha-jnana que afirma que não somos esse corpo, somos a alma. Esse corpo só funciona porque a alma está dentro dele.
Hoje, em Itajaí, nós estávamos caminhando na praia, e avistamos dois peixes grandes, mortos na areia, sem se mover. Anteriormente, eles estavam se movendo e nadando na água; mas se o corpo ainda existe, porque eles não estão mais se movendo? Porque a alma, atma, não está mais ali. Krishna disse para Arjuna: “Todos aqueles que nascem, morrem”.
jātasya hi dhruvo mṛtyur
dhruvaṁ janma mṛtasya ca
tasmād aparihārye ’rthe
na tvaṁ śocitum arhasi
(Bhagavad-gītā, 2.27)
[Para aquele que nasce, a morte é certa, e após a morte, ele voltará a nascer. Portanto, no inevitável cumprimento de seu dever, você não deve se lamentar.]
Krishna disse: “Todos que nascem, um dia irão morrer”. Posteriormente, podemos falar mais sobre isso, pois agora são quase onze horas. Entre em contato comigo pelo Skype ou venha comigo para Matinhos. Não estou dizendo para você renunciar e abandonar sua esposa. Não é isso que eu estou dizendo, senão sua esposa ficará brava. Entre em contato comigo pelo Skype e leia a Bhagavad-gita. Você precisa seguir os quatro princípios e cantar os santos nomes, pois dessa forma, você alcançará a autorrealização.
Os assuntos espirituais não são somente teorias — eles precisam ser práticos. A ciência possui dois significados: o teórico e o prático. E é por meio da prática que a autorrealização é alcançada.
Gaura Premanande!
Hari Haribol!
Transcrição: Chaitanya Sundari Devi Dasi
Edição: Krsna Jivani Devi Dasi e Taruni Gopi Dasi
Revisão: Acyuta Priya Devi Dasi
Colaboração: Madana Gopal Dasa e Premananda Dasa
Ilustração: Syamarani Didi